O Nordeste não precisa explorar energia nuclear. Essa é a opinião do coordenador da campanha de energias renováveis do Greenpeace, Ricardo Baitelo, que também foi palestrante no seminário sobre Energia, dentro do projeto “Motores do Desenvolvimento do Rio Grande do Norte”. Ele explica que a região não necessita de usinas termonucleares — como anunciou o ministro das Minas e Energia, Edison Lobão — porque possui energia limpa em quantidade suficiente. Ricardo Baitelo explica na entrevista a seguir que o que há na realidade é muita oferta de energia eólica e solar e pouca exploração. O representante do Greenpeace comentou ainda que vê de maneira positiva o anúncio de que o Governo federal promoverá leilões para energia eólica. Ele ressaltou no entanto que isso tem de ser feito com base num planejamento de longo prazo. Ainda nesta entrevista, o coordenador avalia a importância do evento que reuniu no Rio Grande do Norte os principais envolvidos no setor de geração de energia.
Qual avaliação pode ser feita com relação a energias alternativas no Brasil?
A gente tem um enorme potencial de energias renováveis. Dependendo do lado por onde se olha pode ter um diagnóstico super positivo e uma crítica de que o uso desse potencial ainda é tímido. Se a gente pensar em energias renováveis e incluir hidroeletricidade e biocombustíveis, a gente vai dizer que o Brasil é referência e que é um exemplo para os outros países do mundo. Mas se a gente pensar que o potencial do país vai muito além disso — a energia eólica tem potencial de 20 Itaipus não explorado — aí a gente pode dizer que o potencial é modesto.
E por que é modesto?
Porque se pensarmos em 143 gigawatts, que é o potencial eólico teórico, e pensar que temos aproximadamente dois milésimos disso explorado, fica claro que a gente poderia explorar muito mais. Energia solar também. O quanto o Brasil poderia atender a comunidades isoladas por meio de energia solar por conta de tanta incidência? É muito sol e vento que se desperdiça ainda. E é combustível gratuito. Então há um grande apelo para aproveitar isso no futuro.
Por que o Brasil dá preferência a grandes projetos de exploração de energia ao invés de programas específicos?
Porque existe uma série de vantagens técnicas e econômicas em manter grandes projetos. A taxa de retorno, a quantidade de energia e a facilidade de gerenciamento. Um exemplo clássico disso é o Programa de Incentivo a Energias Alternativas (Proinfa), no qual se tem 3.300 megawatts; a mesma coisa que tem na usina do Madeira que tem a mesma capacidade e vai sair de uma vez só em alguns anos. E o Proinfa vem lutando. É claro que tem resultados positivos, mas está pulverizado em 144 empreendimentos. Então a geração descentralizada é positiva porque não se tem que gastar tanto; não se perde tanto energia transportando; e fica mais perto dos centros de consumo. Mas é muito difícil gerenciar porque cada caso é um caso. É mais difícil gerenciar 50 do que um só.
O Brasil tem realmente uma política de incentivo à exploração de energias alternativas?
O Brasil tem o Proinfa. Só que este programa já escolheu os empreendimentos e está esperando que eles sejam viabilizados. Mas há muitos outros empreendimentos que estão á procura que estão à espera de uma política. Então, ninguém sabe se o Proinfa vai continuar. É bem provável que ele não continue. Existe a idéia de se fazer leilões. O Greenpeace defende que haja programa com regras sólidas e não apenas o leilão.
O ministro Edison Lobão anunciou aqui que serão feitos leilões para a eólica. Como o senhor avalia esse anúncio?
Um leilão é melhor do que nada, porque a indústria está esperando a continuação do Proinfa. O leilão é importante mas é mais importante que haja o programa completo com a regulamentação. Existe uma série de fatores que tem que puxar: como vai trazer a indústria; como vai ser a desoneração; como vão ser os impostos; como vão ser os incentivos. Só um leilão não resolve. E ainda existe o risco do deságio do leilão acabar gerando o que ocorreu no leilão do ano passado, quando os empreendedores acharam o preço baixo e resolveram não participar. Agora, o ministro falou que haverá não apenas um leilão mas quantos forem necessários. Isso já é um pouco melhor.
O que o Brasil perde por não investir em eólica?
Perde de estar num patamar como a China e a Índia, dois países em crescimento e em desenvolvimento, onde há indústrias se desenvolvendo, muita geração de mão-de-obra numa cadeia muito ampla. Pulveriza muito mais que numa geração centralizada, onde tem pouca gente operando uma usina. Na eólica tem toda a cadeia de produção de pás, de produção de torres, a logística e o transporte. Para a solar mais ainda. Então o Brasil perde de estar se beneficiando disso. Num instante inicial a gente receberia essas fábricas, depois — com a demanda mundial — a gente passaria a exportar essa tecnologia.
Qual a sua opinião com relação a biocombustíveis?
É um assunto delicado. O Brasil precisa de biocombustíveis porque a opção fóssil é mais cara, é mais instável e emite gases que causam o ‘efeito estufa’. Teoricamente é muito positivo que o Brasil tenha a produção de etanol e de biocombustíveis, mas essa produção tem de ser sustentável. E que pare de implicar nos impactos que ela vem implicando, como desmatamento indireto da Amazônia e trabalho escravo. Pode ser a solução, mas também pode se tornar um problema. Tem que ser visto com cuidado. O Brasil pode produzir, pode até exportar, mas dificilmente se tornará uma Arábia Saudita.
O ministro também anunciou que o Nordeste vai ter duas usinas termonucleares. Como o Greenpeace vê isso?
O Greenpeace acredita que o Brasil não precisa de energia nuclear. A nuclear é uma energia suja de outras formas. A gente acredita que ela seria a opção mais cara de todas, apesar da tarifa acabar convergindo para outros valores por meio de vários esforços econômicos. Não há uma solução para os rejeitos, em nenhum país. Se armazena num local, a cidade que fica perto é contra. E o custo disso é altíssimo. E esse custo não está incluído na usina. Existem acidentes menores, de vazamento; e isso vem acontecendo na França. Seis vazamentos ocorreram mês passado. Na Espanha ocorreu vazamento de material. O sistema não é tão seguro assim quando o material vaza e vai parar na boléia de um caminhão e percorre 100 quilômetros.
Qual a sua avaliação do Rio Grande do Norte do ponto de vista energético?
Eu faço uma avaliação bastante positiva. Até emendando com a pergunta anterior, o Rio Grande do Norte pode se valer o menos possível de energias sujas, considerando seu potencial eólico. Tanto eólico em terra quanto no mar. Tem potencial solar também. E biocombustíveis. É um estado extremamente bem dotado dentro do cenário brasileiro e pode vir a ser um exemplo se conseguir usar essa energia.
Não precisa de energia nuclear?
Com certeza que não precisa.
Qual a maior dificuldade que o Greenpeace enfrenta nessa área de energias renováveis?
Há muitos mitos rodeando as energias renováveis e estamos tentando quebrar esses mitos. Como o que diz que a energia eólica é cara. Aos poucos estamos conseguindo. Com a perspectiva de racionamento no início de ano, o governo percebeu que não pode abrir mão de nenhuma forma de energia. O vento está aí e a hora dele chegou.
Qual a avaliação que o senhor faz do seminário ‘Motores do RN’?
O evento foi ótimo. As discussões foram muito boas. O Estado, a indústria e os atores envolvidos estão caminhando para uma consonância muito grande com relação à exploração de energias renováveis e acho que isso vai se consolidar.
FONTE: TRIBUNA DO NORTE
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