segunda-feira, 27 de julho de 2009

E o vento vai levar...

Desde que as palestras do eterno "futuro presidente dos Estados Unidos", Al Gore, se popularizaram mundo afora, sobretudo por meio do documentário "Uma Verdade Inconveniente", a percepção sobre a agonia do planeta vem se tornando cada vez mais real. Fenômenos geológicos recentes - furacões, tsunamis, chuvas apocalípticas - são reveladores da ação inconsequente, para não dizer predadora, do homem sobre o meio ambiente.

O desequilíbrio ambiental causado por emissões poluentes, notadamente as de dióxido de carbono - gás causador do efeito estufa na atmosfera - é um dos principais aspectos por trás desse bicho de sete cabeças chamado aquecimento global. É por isso que uma das mais recentes bandeiras que vêm sendo hasteadas por verdes-ativistas que almejam um mundo sustentável diz respeito à diversificação da matriz energética. Em outras palavras: frear os investimentos na geração de energias "sujas", como a termelétrica - que se baseia na queima de carvão ou óleo combustível -, trocando esses aportes financeiros em tecnologias "limpas" como a eólica - tipo de energia gerada pela força dos ventos.

Ventos da contradição
Curioso pensar que essa alternativa, vista como uma das soluções para a minimização da crise ambiental contemporânea, é uma das mais antigas formas de geração de energia conhecidas do homem. Já na Antiguidade, ela produzia a energia mecânica responsável pela movimentação dos barcos e era utilizada, ainda que de forma rústica, na infraestrutura do cotidiano comum das pessoas, como em equipamentos de bombeamento de água e de moagem de grãos. De acordo com a edição 2009 do Atlas de Energia Elétrica do Brasil, publicação elaborada pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), estima-se que o potencial eólico mundial possa chegar a 50 mil TWh (terawatts/hora) por ano, o que corresponde a mais de 250% do total de energia elétrica produzida em 2007 (que fechou em cerca de 20 mil TWh). Mas, na prática, esgotar esse potencial ainda é uma realidade distante.

Dados do Greenpeace dão conta de que 80% do suprimento primário global de energia ainda advêm de combustíveis fósseis (basicamente, petróleo, gás e carvão - recursos esgotáveis).

Em países nórdicos, como a Dinamarca e a Noruega, a atuação no setor eólico já data de mais de 20 anos, com participação na matriz em torno de 30%. "Atualmente, já existem mais de 100 GW (gigawatts) de capacidade eólica instalados no mundo. É um mercado que está ganhando dimensão e se tornando cada vez mais eficiente", diz Miguel Setas, presidente da EDP Renováveis Brasil, empresa da área de energias limpas. A situação só se mostra diferente no recorte específico do caso brasileiro, em que os números são ínfimos: apenas 0,4% de eólica tem participação na matriz elétrica nacional, segundo a Aneel.

"Miopia"
Para Sérgio Marques, conselheiro fiscal da Associação Brasileira de Energia Eólica e diretor-presidente da BioEnergy (companhia de desenvolvimento de projetos de energia renovável), a fraca performance brasileira no setor é reflexo daquilo que ele chama de "miopia" do governo sobre o assunto. A começar por uma passividade tecnocrata, de preferir o que já está estabelecido em detrimento ao "novo". "Se você olhar o cenário dos últimos leilões de energia no ano passado, verá que existe a inserção muito grande de térmicas", acrescenta.

Essa situação coloca o governo em contradição, na medida em que este justificava os poucos investimentos em fontes renováveis com o discurso de que 40% da matriz elétrica são de origem hídrica, que, como a eólica, também é "limpa". Para Marques, distorções do tipo também refletem as prioridades (ou não) dos governos no tocante às questões ecológicas. "Qual foi a prioridade do governo Lula? A igualdade social, de trazer as camadas D e E para C. Em nenhum momento teve preocupação com o meio ambiente. Você não vê o Brasil, nos últimos anos, investindo em veículo aeroespacial, em tecnologias de compostos. Não vê incentivo para eólicos", lamenta.
O caso americano também é representativo no que se refere às prioridades estatais. Marques lembra que, enquanto no governo George W. Bush, o secretário de Energia (Samuel Bodman) era envolvido com indústria petroleira (assim como a própria família Bush) - o que possivelmente explique o "boicote" ianque ao Protocolo de Kyoto.

Caso brasileiro
A cruzada por incremento de investimentos na ventania tupiniquim é oportuna pelas excepcionais condições para o seu desenvolvimento existentes por aqui. Segundo Roselice Duarte, diretora do departamento ambiental da BioEnergy, a região sul apresenta potencial eólico semelhante ao da Europa, e o do Nordeste brasileiro chega a ser superior. Não à toa, a companhia toca, atualmente, 14 projetos apenas no Rio Grande do Norte, em vista do leilão específico para energia eólica prevista pelo governo para novembro deste ano. "A eficiência energética é diretamente proporcional à velocidade e à constância dos ventos, explica Roselice. Marques menciona as recentes chuvas que alagaram cidades nordestinas para se entender as possibilidades da otimização eólica na região. "Quando chove, não venta. Quando venta, não chove", sintetiza.

Os impactos ambientais na geração de energia eólica são praticamente inexistentes. Eles estariam atrelados aos efeitos intrínsecos a qualquer obra de construção, como a terraplanagem para instalação das torres, eventuais reformas viárias para melhoria dos acessos aos parques, canteiro de obras e remoção de vegetação, dependendo da topografia. Mas o ganho principal da eólica está mesmo na emissão limpa de resíduos na atmosfera. "O nível médio de emissões pode ser 50 a 100 vezes inferior ao de uma usina térmica a carvão ou a óleo", empolga-se Setas.

Na gestão Barack Obama, o belicismo e a o descaso ambiental serão (ou já estão sendo) fortemente combatidos. O perfil do atual secretário de energia, Steven Chu, é revelador dessa mudança de perspectiva: trata-se de um físico que faturou o Nobel de sua categoria em 1997, e que ficou conhecido por habituar-se a ir de bicicleta ao trabalho, entusiasta que sempre foi das premissas de uma vida sustentável. O próprio Obama, em declarações recentes, chegou a dizer que "o país que descobrir como gerar energia limpa e barata será a nação economicamente mais poderosa do planeta no futuro".

Entusiastas da onda eólica contestam a difundida ideia de que o preço para geração desse tipo de energia seja mais alto na comparação com outras formas. "O que estamos assistindo hoje no mercado da energia eólica é uma gradual otimização dos custos de investimento, à medida que esta forma de energia ganha expressão no panorama energético mundial", avalia Setas.

A visualização desse cenário em números fica assim: enquanto a eólica apresenta custos de R$ 200/MWh (megawatts/hora), seu par termelétrico sai por R$ 140/MWh. No entanto, Marques explica que os valores em questão são uma sigla, ICB (índice de custo-benefício), que, no caso da termelétrica, refere-se à usina parada. "Na hora que ela gera a energia, tem um combustível que não está englobado aqui (no cálculo). Acrescido esse valor do combustível, a tarifa vai para perto de R$ 500/MWh", assegura. "Um investimento médio num MW hidrelétrico, com necessidade de compensações ambientais, pode ultrapassar o investimento médio de um MW eólico", reforça Setas.

fonte: Yahoo

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