sábado, 27 de outubro de 2007

Na China, energia ecológica está atrasada

Pelo final do ano que vem, um enlameado canteiro de obras em Boxing, uma área rural do leste da China, terá sido substituído por uma pequena usina de energia que queima sabugos de milho e hastes de algodão a fim de gerar eletricidade para as aldeias vizinhas e vapor para um complexo industrial anexo.
A usina poderia ser concluída mais cedo, mas apenas quatro empresas na China produzem as caldeiras de precisão que uma usina de biomassa requer. Todas essas companhias estão enfrentando um enorme acúmulo de pedidos e de entregas atrasadas. E o setor de turbinas de energia eólica enfrenta dificuldades semelhantes no país.
A mesma grande empresa de energia que está construindo a usina verde em Boxing, a CLP, acaba de inaugurar uma usina acionada a carvão no extremo sul do país. Concluída no prazo e por metade do custo que teria no Ocidente, a usina vai gerar 1,2 mil megawatts de eletricidade - ante seis megawatts para a usina de biomassa de Boxing. A CLP ficou tão impressionada com os resultados que decidiu participar de uma concorrência para a construção de usinas termelétricas acionadas a carvão na Índia.
Essas são as realidades que as empresas que tentam melhorar suas credenciais ambientais enfrentam na China, país em que o carvão é rei. Usinas a carvão são mais baratas e fáceis de construir, bem como mais fáceis de operar. Embora o governo chinês tenha estabelecido metas para aumentar o uso de uma longa lista de fontes alternativas de energia - entre as quais energia eólica, biomassa, hidrelétrica, solar e nuclear -, todas elas enfrentam obstáculos, que variam da burocracia a gargalos industriais. As diferentes opções de energia adotadas pela CLP são um exemplo claro sobre a maneira pela qual uma empresa enfrenta a necessidade de prover energia a centenas de milhões de asiáticos empobrecidos, ainda que esteja disposta a manter seu objetivo de limitar as emissões de gases causadores do aquecimento global.
Controlada pela família Kadoorie - uma das mais ricas de Hong Kong e adepta há muito de causas ecológicas-, a CLP começou a debater na terça-feira os seus planos de limitações de emissões de gases do aquecimento global.
Embora os detalhes não tenham sido integralmente definidos, a empresa planeja assumir o compromisso de "reduzir de maneira material e dramática" as emissões em países industrializados como a Austrália, enquanto tenta conter seu crescimento nos países em desenvolvimento como a China, disse Andrew Brandler, presidente-executivo do grupo.
"Acreditamos que o mundo precise enfrentar com urgência a questão das alterações climáticas", ele declarou.
Mas as operações da CLP vêm crescendo com tamanha rapidez na China, Índia e outros países em desenvolvimento, em resposta à demanda acelerada por eletricidade, que Brandler afirmou que, pelo menos em curto prazo, as emissões totais do grupo poderiam crescer.
O problema é especialmente agudo porque os governos da Ásia, da China à Índia, Indonésia e Filipinas, estão recorrendo principalmente ao carvão como forma de atender à elevação na demanda por eletricidade e impedir apagões, mesmo que o carvão produza mais gases de aquecimento global do que qualquer outro método importante de geração de eletricidade.
A China oferece o caso de maior elevação. O país construiu 14 mil megawatts de capacidade de geração de eletricidade acionada por combustíveis fósseis no ano passado, com quase todas as usinas recorrendo ao carvão como fonte de energia, e este ano deve acrescentar mais 95 mil megawatts de usinas termelétricas.
Em comparação, no Reino Unido o total de usinas acionadas a carvão, construídas ao longo de décadas, responde por 75 mil megawatts de capacidade de geração.
A alternativa mais comentada como alternativa ao carvão na China, gira em torno de planos para quadruplicar a energia nuclear gerada no país até 2020. Mas o plano, que prevê a instalação de dezenas de novos reatores - ainda assim representaria apenas 31 mil megawatts de energia nuclear pelos próximos 12 anos.
"É um total minúsculo", diz Jonathan Sinton, especialista em assuntos chineses na Agência Internacional de Energia. A China constrói mais capacidade de geração na forma de usinas acionadas a carvão a cada quatro meses.
E ainda assim restam duas questões importantes quanto a esse objetivo modesto: será que a indústria do país terá capacidade de fabricar equipamento para dezenas de reatores nucleares, e a China conseguirá treinar trabalhadores em número suficiente para operá-los?
Na usina nuclear da CLP na baía de Daya, perto de Shenzhen, um domo de aço enrijecido, do tamanho de uma casa, estava posicionado ao lado de um guindaste imenso, em uma manhã recente, à espera da operação que o instalaria no topo do sexto reator nuclear da usina.
Mas pelo menos o domo estava lá - em outras partes da China, os reatores podem ter de esperar anos pelos seus domos. Apenas um punhado de siderúrgicas no mundo é capaz de produzir os espessos domos, e as duas primeiras siderúrgicas chinesas que operarão no ramo só agora estão recebendo os equipamentos necessários a produzir esse tipo de componente.
Os 1,75 mil trabalhadores da usina vêm treinando estagiários em grupos de 500, de acordo com Stephen Lau, vice-diretor da usina; a estatal que controla a geração de energia nuclear pediu que grupos de mil alunos fossem treinados, mas a joint venture que dirige a usina não pôde atender ao pedido.
No caso das usinas acionadas a carvão, não há escassez de mão-de-obra. A China está repleta de usinas termelétricas estatais decrépitas que empregam de 900 a mil trabalhadores para produzir apenas 50 a 100 megawatts. O governo muitas vezes pede que empresas fechem uma dessas usinas antigas, ineficientes e poluentes antes de permitir a instalação de uma usina termelétrica a carvão moderna.
Um dos problemas mais estranhos da política chinesa de energia é a falta de controles ambientais sobre as usinas a carvão, porque as regras que as regem foram escritas muito tempo atrás. Os projetos de energia renovável, na verdade, enfrentam revisões muito mais severas de seu impacto ambiental.
Fonte: Invertia

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